FUTEBOL E FILOSOFIA DE BOTEQUIM
(Minha coluna no BOM DIA Rio Preto em 17/6/2010)
Os monges de Dunga cumpriram direitinho o script. O time jogou um futebol nanico e fez para o gasto no esquelético placar de 2 a 1 diante da poderosa Coreia do Norte. Esconderam tanto o jogo nos treinos secretos que não conseguiram encontrá-lo depois. A equipe brasileira foi, enfim, mais Dunga do que nunca, com economia de habilidade, apenas relances de lucidez e um golaço que caiu do céu, naquele chute do Maicon, sem ângulo. Ele mesmo confessou: já estava “sem perna”, fez o gol meio sem querer, numa jogada que o antigo técnico flamenguista Cláudio Coutinho – que dirigiu o Brasil na Copa de 1978 – chamava de overlaping: quando o lateral inverte posição com o ponta ou o meia e recebe na cara do gol. Uma jogada explorada por qualquer treinador medíocre.
O jeito Dunga de jogar frustra, mas não surpreende. E o bom é que, bem ou mal, cumpriu com sua obrigação “goleando” o time de robôs da Coreia, que chamou atenção muito mais pelo choro convulsivo do seu atacante do que pelo futebol. Em noventa e poucos minutos, o rapaz chorou mais do que a Alinne Moraes em toda a novela “Viver a Vida”. E olha que os coreanos ainda conseguiram a incrível façanha de fazer um gol no Brasil quando até o Dunga estava ficando mais corajoso nas substituições. Aliás, em poucos minutos no final da partida, Nilmar fez mais que Luís Fabiano, o “fabuloso”. Ao final da partida, o goleirão Júlio César chegou a uma fantástica conclusão e repetiu a filosofia de boteco: não tem mais bobo no futebol.
E por falar em boteco, filosofia e futebol, me vem à memória um inusitado encontro que tive com Sócrates, o Brasileiro, ídolo corintiano e craque da maravilhosa e perdedora Seleção da Copa de 1982, na Espanha. Assim como agora, em que se fala muito na convocação de Dunga (que não gosta de jogador que bebe, mas faz propaganda de cerveja), desde aquela época se questionava muito essa relação atleta-cachaça. Não é segredo para quase ninguém que Sócrates nunca economizou na velha e boa cervejinha gelada, e nunca fez questão de esconder isso. Em campo, ele se garantia. Tanto que foi chamado duas vezes para a Seleção (82 e 86) por ninguém menos que o rigoroso Telê Santana, o mestre dos técnicos. Telê era disciplinador, mas não era bobo.
Tempos depois da Copa de 1986, que o Brasil de Telê também perdeu, no México, entrevistei Sócrates em Rio Preto. Ele veio para um simpósio promovido pelo fisioterapeuta Ademir Rodrigues. Eu e o fotógrafo Eduardo Secco fomos nos encontrar com Sócrates numa sexta-feira, de madrugada, no hotel, em meio a outros convidados. O craque nos recebeu muito à vontade, naturalmente cercado de latinhas de cerveja oferecidas pelo anfitrião. Enquanto bebia, Sócrates não estava nem aí para as fotos feitas pelo Secco, já também meio embriagado.
Depois de tomar um “balde” junto com ele e de fazer as perguntas “imprescindíveis”, deixei para o final aquela pergunta que não poderia faltar:
-- Sócrates, até que ponto você se sente incomodado com essa fama de jogador bebedor de cerveja?
Virou mais uma latinha na boca, deu outra golada pra lá de apetitosa e respondeu, sossegado e gozador:
-- Isso nunca me incomodou, só me ajudou. Já ganhei foi muita caixa de cerveja por causa disso!
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