segunda-feira, dezembro 15, 2014

O América de Rio Preto na era Pelé (Parte 1)

Nas areias do Córrego Canela

Manhã de verão em 1950, um menino finca os pés no brejo do Córrego Canela. Havia conseguido arrancar cinco litros de areia fina nas águas daquela baixada, entre o centro da cidade e a Vila Santa Cruz. As madames pagavam 50 centavos pelo litro daquele produto, usado para lustrar alumínio. Quando não era no Canela, o menino estava no Córrego Borá, na outra baixada.
Correu para entregar a areia fina nas residências elegantes da área central de Rio Preto. Voltando das casas elegantes, passou pela ponte de madeira do Canela e começou a caminhar pela estrada Boiadeira, onde coletava estrume de gado para vender como esterco. Enquanto recolhia o estrume da Boiadeira, olhou para o céu, o sol indicando quase meio-dia. Estava na hora de ir para o colégio Santo André.
Foram assim para ele os últimos anos. Tirar areia fina no córrego, juntar esterco, fazer as vezes de servente de pedreiro, estudar à tarde e jogar futebol descalço aos domingos. O garoto já beirava a maioridade em 1955 quando passou a defender junto com o amigo Rui Bolinha o time amador do Torino, equipe formada para homenagear o Torino italiano, extinto em desastre de avião.
De tanto trabalhar duro de servente, pegou jeito e acabou promovido a pedreiro “meia-colher”. O sol ainda não havia dado o ar da graça quando ele se dirigia à Boa Vista para ajudar a levantar uma edificação. No meio do caminho, começou a chover. Deu cheia no Canela. Com tanta água caindo, não dava mesmo para assentar os tijolos, pensou. Caminhou pela Boiadeira e resolveu matar o restante da manhã vendo o treino no “Mário Alves Mendonça”, o estádio das traves quadradas.
Avistou Hudson, o amigo vidraceiro que jogava no América, gritando de dentro do gramado:
– Entra aqui, garoto. Vem completar os reservas na lateral esquerda.
Calçou uma chuteira surrada, emprestada pelo mordomo do clube, e entrou. Sapateou feito gente grande na grama molhada. No final, o treinador pergunta o seu nome.
– É Benedicto – respondeu. E ouviu em seguida:
– Então você é meu xará, bichão. Me chamam de Birigui, mas meu nome é Benedito Teixeira. Volta aqui amanhã para a gente treinar de novo, vou arrumar um lugar para você no time.
– Não posso. Se não chover mais, tenho serviço logo cedo lá na Boa Vista.

Uma semana depois, Birigui manda o jogador Bertolino buscar Benedicto na casa dele, duas quadras acima do Canela. Pega o contrato na mão, conversa com os pais e assina: “Benedicto Ambrózio”.
(Continua)

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